INTRODUÇÃO
Quando percebemos o rápido êxito conseguido pelo cantor Robertd Carlos e a sua aceitação fácil, não só pelos jovens como por crianças e até adultos, ocorreu-nos a possibilidade de localizar as causas determinantes da queda do prestígio dos intérpretes da chamada "bossa nova" e da ascensão do jovem cantor de "ié-ié-ié" nacional.
Embora para muitos tudo não passasse de uma simples voga, bastante comum no comportamento do grande público que costuma trocar seus ídolos de tempos em tempos, tínhamos impressão diversa, crendo na existência de razões mais sérias e considerando a hipótese de representar o "ié-ié-ié" uma válvula de escape encontrada pela maioria para compensar frustrações, anseios ou extravasar energias que, naquela altura, não conseguíamos definir.
Dessa curiosidade, surgiu a reportagem "Juventude vive a rebelião romântica", publicada em um matutino paulistano (O Estado de São Paulo - 08/05/1966), resultado de uma série de entrevistas que tivemos com professores de prestígio, catedráticos da Universidade de São Paulo. Estes concordaram em expor suas teorias sobre as razões do êxito do jovem cantor que, naquele momento, era bem recebido por todos os grupos etários e, aparentemente, por todas as camadas sociais. A unificação das interpretações apresentadas mostrou, então, a existência de fatores realmente importantes para o entendimento do fenômeno que, considerado superficialmente não passava de uma simples conseqüência da simpatia despertada pelo jovem entre seus ouvintes, aliada ao ritmo quente e alegre da nova música.
Este livro é a ampliação daquela reportagem, enriquecida agora com novas pesquisas e consulta de pràticamente todo o ;material publicado sobre Roberto Carlos, numa tentativa de for tecer aos interessados uma visão do significado da adesão maciça ao cantor, dentro do contexto social e político em que vivemos. Talvez possa parecer exagero admitir-se tais conotações:na análise do fenômeno, entretanto, exagero seria tentar-se explicar o êxito do cantor Roberto Carlos, desprezando-se a influência das circunstâncias que, no momento, afetam o comportamento da população, notadamente a que vive nos centros urbanos.
Naturalmente, não seria possível analisar-se a ocorrência do «ié-ié-ié» no Brasil sem ligá-lo à sua origem européia e sem relacioná-lo com outros movimentos juvenis de protesto ostensivo. Daí, o capítulo dedicado ao comportamento da mocidade contemporânea, que ora parte em demanda de objetivos definidos, ora age irracionalmente externando uma rebeldia «sem causa» ou ainda extravasa suas energias em demonstrares toleradas e até estimuladas pelo mundo adulto.
No primeiro caso, os objetivos da juventude são, geralmente, de alteração dos conceitos políticos ou sociais da estrutura em que vivem, razão pela qual todo um organismo de repressão é utilizado para impedir tais tentativas; no segundo caso, são manifestações destituídas de senso que atentam contra a estabilidade social, pelo que seus autores são considerados proto-delinqüentes e mobilizado contra eles todo um aparato policial; enfim, no terceiro caso, a juventude não tem consciência suficiente para tomar posições definidas, nem as condições do meio ambiente favorecem a delinqüência, surgindo, então, uma atitude de oposição franca à sociedade, porém, não quanto ao seu aspecto estrutural mas sim quanto aos seus hábitos, procurando chocá-la, escandalizá-la, sem intenções de reformá-la.
No levantamento das razões determinantes do surgimento de um ídolo, não poderia, também, ser omitida a participação decisiva dos meios mecânicos de comunicação, característicos do mundo moderno, postos a serviço da propaganda para atender interesses econômicos ou interesses políticos do Estado. Por esse motivo, na compreensão do fenômeno Roberto Carlos o papel dos meios de difusão, notadamente a televisão, subordinados a interesses publicitários, merecem referência especial.
Mesmo porque, ao êxito musical do cantor estão unidos alguns investimentos comerciais bastante lucrativos, todos relacionados com a introdução no mercado de uma nova marca, lançada para transformar o desejo de imitação do ídolo em fonte de consumo.
Outro aspecto que não foi esquecido diz respeito à atitude com . que os adultos aceitaram o movimento juvenil, revelando grande simpatia pelos seus líderes e utilizando a popularidade deles para promover até campanhas beneficentes. De modo geral, a sociedade mostrou-se satisfeita com o tipo de rebelião por eles preconizada, registrando-se diversos depoimentos francamente favoráveis à juventude «ié-ié-ié», considerada como bastante equilibrada e capaz de trazer sossego ao mundo adulto.
Parece-nos que essa atitude adesista e até estimuladora está relacionada com a figura do líder do movimento, razão pela qual procuramos interpretar seus depoimentos publicados na imprensa, bem como seu comportamento ante situações diferentes. As conclusões quanto à liberalidade ou conservadorismo do jovem rebelde são apresentadas no final deste trabalho, depois de algumas observações que nos pareceram essenciais.
Resta-nos agradecer aos profs. Fernando de Azevedo, Octávio Ianni, Ruy Coelho, Egon Schaden e Anita Castilho Cabral as contribuições que nos deram por ocasião da reportagem «Juventude vive a rebelião romântica» e que nos foram mais uma vez valiosas. Incluímos nesse agradecimento todos os colegas de imprensa que dedicaram maior atenção à figura do líder do «ié-ié-ié» e à juventude que ele representa, pois muito nos auxiliaram na avaliação das proporções do fenômeno.
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