26 de dez. de 2011

A PRIVATARIA TUCANA Epílogo

  • Epílogo
Depois desta jornada pelos pântanos da política em que todos são vilões e o Brasil é a vítima, acho importante encerrar a narrativa com algumas observações. A primeira delas é que o país e suas instituições não têm o direito de continuar fazendo de conta que não viram a rapinagem organizada que devastou os bens do Estado nos anos 1990 e começo da década seguinte. E que serviu para tornar os ricos mais ricos.
Varrer a sujeira para debaixo do tapete, como se fez tantas vezes, não é mais possível. Não há tapete suficiente para acobertar tanto lixo. O Brasil, que escondeu a escravidão e ainda oculta a barbárie de suas ditaduras, não pode negar aos brasileiros a evisceração da privataria. Quem for inocente que seja inocentado, quem for culpado que expie sua culpa.
Se isso não acontecer, isto é, se a memória do saque não se tornar um patrimônio dos brasileiros, o país poderá repetir esta história, mais cedo ou mais tarde. Não é demais reparar que, na América Latina, estamos atrasados nestas providências. No México, o ex presidente Carlos Salinas de Gortari — espécie de santo padroeiro da privataria latina — crivado de denúncias de corrupção, saltou em seu jatinho e fugiu para Nova York. Na Bolívia, após privatizar até a água, que entregou à francesa Suez Lyonnaise des Eaux e à norte americana Betchel, o “modernizador neoliberal” Gonzalo Sánchez de Lozada foi ejetado do seu trono aos gritos de “assassino” e voou para Miami.
Tripulando uma razia privatizante que liquidou até mesmo estatais que davam lucro e um processo de concentração de renda que desempregou 30% da população ativa, Carlos Menen virou sinônimo de azar. Na Argentina, as pessoas dizem “Mendéz” para não pronunciar seu nome receando uma catástrofe. No Peru, após aprovar sua segunda reeleição, Alberto Fujimori evadiu se do país sob acusação de surrupiar US$ 15 milhões do erário e de autorizar a execução de dissidentes. Condenado a 25 anos de prisão, Fujimori admitiu, depois, ter concedido propinas — “briberization”, como diria Joseph Stiglitz — o que somou à sua pena mais alguns anos
de cadeia.
Para quem entende a desigualdade social como um valor em si mesmo e o Estado do Bem Estar Social como um trambolho no caminho da realização plena do indivíduo, Salinas de Gortari, Sánchez de Losada, Menem, Fujimori e similares fizeram o que tinham que fazer. Foram flagrados — uma lástima do seu ponto de vista — mas não se pode fazer maiores reparos à sua ação política em termos de coerência.
Resta saber se quem interpreta o Estado Mínimo como uma perversidade ineficaz — aqui ou em qualquer outro lugar — está disposto a fazer valer sua condição cidadã e exigir da Polícia, do
Fisco, do Ministério Público e da Justiça que cumpram a sua parte.
Se jogar uma luz sobre este passado ainda imerso nas sombras, este livro, que termina aqui, terá cumprido a sua parte. E tudo o que houve terá valido a pena.

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