26 de dez. de 2011

A PRIVATARIA TUCANA capitulo 15

  • Capitulo 15 - Os vazamentos no “bunker”do Lago Sul
- “Quem esta proximo ao Pimentel vai ser varrido.”
- Sou antipetista, anuncia o araponga.
- O bombardeio midiatico contra a campanha.
No início de abril de 2010, cuidava das minhas uvas no interior de Minas, quando recebo uma mensagem do amigo Luiz Lanzetta, então contratado para montar a assessoria de imprensa da campanha de Dilma Rousseff à Presidência da República.
Desde o começo de março, Lanzetta, através da Lanza Comunicação, havia feito uma parceria com a Pepper Interativa, contratada pela mesma campanha para tocar a parte de internet.
A Pepper, por sua vez, já tinha os contratos com as empresas americanas Blue Stage e Mensage Revolution. Ambas tinham tocado com grande badalação a campanha de Barack Obama à presidência dos EUA. Para isso, a Lanza e a Pepper locaram uma imensa casa no Lago Sul, na QI 05, que logo ganharia em O Globo o apelido de “Bunker da Dilma”.
A casa não era um comitê da campanha. Era uma extensão das duas empresas. Mas ali já estavam trabalhando dezenas de profissionais, como jornalistas, fotógrafos, cinegrafistas, técnicos, especialistas em internet, cada qual recrutado de uma forma diferente.
Também havia o estúdio de rádio, onde a candidata iria gravar os seus programas que seriam distribuídos na rede.
Lanzetta estava preocupado. Havia frequentes vazamentos de informações.
Instalou se um clima de paranoia que foi se agravando gradativamente e tornando se mais denso conforme 2010 avançava.
Uma visita à casa da QI 05 serviu para aumentar minha inquietação.
Todo mundo desconfiava de todo mundo. A insegurança era geral.
Detectara se, ainda, que pipocavam arremetidas na mídia contra o núcleo que se agrupara, na área da comunicação, em torno do ex prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, um dos coordenadores da campanha, grande amigo da candidata, que eleita, o tornaria ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
No dia 26 de fevereiro, IstoE publica a primeira de uma sequência de quatro matérias contra Pimentel. No auge do mensalão do DEM, a revista resolve exumar o mensalão de 2005 e acusar o ex prefeito de envolvimento no escândalo que, no primeiro mandato de Lula, engolfou a cúpula paulista do PT. Tudo porque, quando prefeito, firmou convênio com a Câmara de Dirigentes Lojistas para instalar câmeras de segurança nas ruas do centro da capital mineira. A vinculação ocorreria devido ao fato de que o então diretor financeiro da CDL fora identificado como doleiro supostamente envolvido na fraude... A matéria não ficava em pé. Pimentel nunca foi da cúpula do partido. Pelo contrário, era e é um outsider no PT. Mas nem a manifestação do MPF afirmando expressamente que Pimentel nada tinha a ver com o processo47 foi obstáculo para a retomada do assunto novas vezes.
47 Na ocasião do contrato com a prefeitura, o diretor financeiro da CDL era Glauco Diniz Duarte, mais tarde denunciado como doleiro. Parte do dinheiro teria sido remetida ao exterior para pagamentos ao marqueteiro Duda Mendonça. Em nota, Pimentel afirmou que nunca foi “inquirido,
arrolado, indiciado, denunciado ou ouvido por qualquer ligação, ainda que indireta, com o esquema do mensalão”. Em 26/02/2010, o procurador Patrick Salgado Martins, do MPF/MG, disse que os fatos narrados por IstoE estavam “fora de contexto” e afirmou textualmente: “Não há nenhumaprova ligando Pimentel ao mensalão. Obviamente, por essa razão, ele não foi denunciado. Se houvesse alguma prova, isso teria acontecido”.
São matérias marteladas em sequência. Logo, mais coisas pesadas.
Surgem notícias em O Globo sobre “o bunker”. Lá, funcionaria uma fábrica de falsidades onde haveria, até, um “editor de mentiras”.
Na mesma época, plantam se notas em toda a mídia contra Marcelo Branco, homem da internet que a própria Dilma convidara para a pre campanha. Todas as burradas são atribuídas a Branco.
A começar pelo affaire Norma Benguel,48 uma confusão com uma fotografia publicada no blog de Dilma que não foi de Branco e sim do marketing. Bastante ruim, o programa de rádio era conduzido por Falcão, mas também caiu na conta de Branco. Tudo porque ele era próximo da candidata. Quem estava na mesma situação era queimado. Um amigo de Dilma sintetizou para Lanzetta a disposição do pessoal de São Paulo: “Quem está próximo ao Pimentel vai ser varrido. Essa é a ordem...”.
Outra preocupação de Lanzetta apontava para um punhado de petistas paulistas, reunidos numa empresa chamada Marka, de Valdemir Garreta, Marcelo Parada e Edson Campos, e apadrinhados pelos deputados Antônio Palocci e Rui Falcão — mais tarde, descobrir se ia que Falcão era sócio do grupo... Ao contrário do que se pensara na ocasião, Garreta e os seus não estavam mais alinhados à ex prefeita Marta Suplicy. As partes estavam rompidas.
Mas, para todos, sem excluir segmentos da campanha, o trio encarnava ainda a influência da então candidata do PT ao Senado por São Paulo. Nenhum deles negava a informação, embora a relação entre Marta, Falcão e Garreta já estivesse sepultada.
Em fevereiro de 2010, quando se tornou público que a assessoria de imprensa da campanha ficaria sob a responsabilidade de Lanzetta e de seus parceiros Mário Marona e Robson Barenho, os três com cerca de 40 anos de experiência jornalística, os recados começaram a chegar mais fortes. Lanzetta teria que abrir espaço para o grupo de São Paulo.
48 Uma foto em que aparece a atriz Norma Benguel durante uma manifestação contra a ditadura militar nos anos 1960 foi publicada no site de Dilma de tal forma, que induziu as pessoas a entenderem que se tratava da candidata. Inflado pela mídia, o equívoco transformou se em uma onda de ataques contra a candidata do PT até que a própria Norma Benguel, entrevistada, demonstrou não dar maior importância ao tema, o que contribuiu para esvaziar o episódio.
Para ele, Lanzetta, estaria reservado um cargo de assessor para fazer contatos com algumas redações. Caso não compusesse desta maneira ou saísse do caminho, os “métodos” de Garreta seriam exercitados. Logo veremos o que é o método Garreta de fazer amigos e influenciar pessoas.
Imersa em suspeitas, com todos desconfiando de todos, a casa continuava vazando. Falava se algo em uma reunião e, no outro dia, a informação estava estampada nas colunas dos jornais. Nesse
ambiente crivado de ciladas, Lanzetta procurava um escudo para sua empresa e para si próprio. Queria a minha ajuda.
Caro, você conhece todos os arapongas desta cidade. Eu não sou da área — sintetizou.
Ele me disse também que estava consultando com Danielle Fonteles, dona da Pepper, algumas firmas de segurança indicadas por conhecidos.
Desconfiava se de grampos e de infiltração de pessoas. A casa era grande e devassada. E frequentada por muita gente. As ações poderiam vir de qualquer lado. Tanto dos adversários, o que seria “legítimo”, quanto de dentro, de gente querendo abrir espaço na marra.
Pintado esse quadro, fui à Brasília procurar o ex sargento da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, o “Dadá”. Levei o ao “bunker” da QI 05. Conversamos sobre a atuação de Marcelo Itagiba, em atividade frenética fazia dois anos, principalmente dedicada ao levantamento de dossiês sobre o PMDB. Garimpava material para Serra pressionar deputados peemedebistas que pudessem influenciar favoravelmente uma aliança com o PSDB em detrimento da provável coligação com o PT.
Dadá descreveu um cenário assustador, mostrando todos os furos na segurança. Aquilo que O Globo chamava de “bunker” só tinha de “bunker” o apelido.
O dono da Lanza levantou a hipótese de ações de setores do próprio PT e falou claramente em Valdemir Garreta. Considerava se ameaçado, por causa dos recados transmitidos por um dos sócios de Garreta. Dadá não poderia fazer o serviço, mas tinha uma indicação a dar: a empresa de um ex delegado da Polícia Federal, com estágio no FBI, especialista em contraespionagem, e
que teria entre os seus clientes duas prefeituras do PT. Seu nome era Onézimo das Graças Sousa.
Especializado em cozinha alemã, o Fritz, na Asa Sul, existe desde os primórdios da capital e já desfrutou dias melhores. Sempre foi também o restaurante preferido para encontros entre arapongas e congêneres. Com a casa bichada, marcou se no restaurante a conversa entre os três — eu, Dadá e Lanzetta — com o ex delegado Sousa. Por ingenuidade, não percebi o risco que Lanzetta corria em uma reunião com alguém desconhecido, até mesmo por mim, e, pelo que se viu depois, disposto a qualquer coisa. Porém, como não queria negociar nada envolvendo dinheiro com quem quer que fosse, entendi que seria necessário que alguém responsável pela casa estivesse presente.
Na última hora, juntou se ao grupo o empresário Benedito de Oliveira Neto, amigo de Lanzetta, e que estava ajudando na parte administrativa e logística da casa da QI 05. “Bené”, como é bastanteconhecido, havia indicado o pessoal para cuidar da administração e infraestrutura. Foi vítima de um convite em cima da hora.
Lanzetta justificou assim: “Precisava de uma testemunha”. A “testemunha” Bené virou alvo fixo de boa parte da mídia...
Sousa e Dadá chegaram juntos. Imediatamente, fomos para uma sala no fundo do restaurante. Não havia ninguém. Feitas as apresentações e trocados os cartões, o ex delegado toma a palavra e pergunta: — E o Pimentel?
Não havia nenhum encontro marcado com Fernando Pimentel.
Depois nos inteiramos do motivo atrás da pergunta. A arapuca estava montada para Pimentel. Ao contrário do ex prefeito, nem eu nem Lanzetta, muito menos Bené, éramos do PT. Não tínhamos
participação formal, em cargos, na campanha. Era um encontro entre duas empresas privadas, a Lanza e a de Sousa, prestadora de serviços de segurança.
Mesmo assim, na ausência do briefing que Dadá teria que ter feito, o ex delegado engata uma retórica esquisita. E afirma, categórico: — Campanha eleitoral é dinheiro. Nós sabemos transportar dinheiro sem deixar rastros. Com segurança.
Este era, segundo o próprio Sousa, o principal produto que tinha a oferecer.
Eu sou apenas um jornalista. Não trato disso — respondeu Lanzetta.
Logo a conversa toma outro rumo: a segurança da casa da QI 05. É quando Sousa e Dadá descrevem seus métodos de trabalho.
Vendem o “perigo” Marcelo Itagiba,49 relatando como agia o deputado delegado.
Vocês estão dois anos atrasados... Eu vim do lado de lá e sei como eles trabalham — referiu Sousa.
No meio da explanação, Lanzetta pergunta ao ex delegado o que faria para prevenir ações que certamente partiriam de setores do PT contra sua empresa. E cita explicitamente Garreta e sua fama de mau. A resposta é reveladora do terreno movediço em que estávamos pisando ali naquela tarde na mesa dos fundos do Fritz: — Não tem problema, eu sou antipetista — retorquiu sem titubear.
49 Também ex diretor de inteligência da Polícia Federal no governo Fernando Henrique Cardoso, Marcelo Itagiba envolveu se na Operação Lunus, da PF, em 2002. Visando atingir a candidatura de Roseana Sarney (PFL) à Presidência da República, a ação resultou na apreensão de R$ 1,3 milhãono escritório da empresa de Roseana e de seu marido, Jorge Murad, em São Luís (MA). Segundo o senador José Sarney (PMDB), o objetivo era tirar Roseana da disputa pelo Planalto pois seu crescimento nas pesquisas ameaçava a candidatura de Serra. Sarney advertiu FHC e informou sobrea existência de dossiês contra os tucanos Paulo Renato de Souza, Tasso Jereissati e Pedro Malan, todos adversários de Serra na cúpula do PSDB.
Em nenhum momento toca se no nome de Rui Falcão. Aliás, naquele momento, ninguém suspeitava dele. Tampouco existe, em qualquer situação, alguma referência ao nome de José Serra. O ex delegado pede R$ 160 mil por mês, valor considerado irreal.
Antes do final da reunião, Lanzetta levanta se. Informa que tinha outro compromisso e vai embora. Nunca mais fala ou se encontra com nenhum dos dois, Sousa ou Dadá.
No início de maio de 2010 retornei à Brasília para retomar as negociações com o pessoal da comunidade de informações. O ponto de encontro agora é a confeitaria Suíça Praline, local preferido de Dadá “por só ter velhinhos, o que não gera suspeitas”. No encontro, só estamos eu, Dadá e Sousa. Expliquei que, diante do risco de fogo amigo, seria muito arriscado coloca los dentro da casa. E apresentei a proposta de Lanzetta: R$ 80 mil em troca de um relatório de contrainformação sobre as atividades do tal grupo liderado por Itagiba.
Argumentei ainda que a Lanza e a Pepper já tinham fechado a contratação da DigiLab, uma empresa do Sul, especializada em segurança de Internet. A empresa trataria também dos blogs que
seriam lançados a seguir. A necessidade era notória, pois quando surgiu o primeiro, o Blog da Dilma, houve vários ataques de hackers desfechados desde o exterior. Naqueles dias já se noticiava a baixaria arquitetada na rede, que seria atribuição do secretário de comunicação do PSDB e homem de Serra para a internet, Eduardo Graeff.
O delegado detestou. Furioso, reclamou:
Gastei duas semanas de trabalho pra não receber nada. E você me vem com uma proposta dessas? — redarguiu.
Depois, no seu depoimento na Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (Ccai), do Congresso, Onézimo Sousa irá negar a segunda reunião na confeitaria Praline. Mas o fato puro
e simples é que ela aconteceu...
Esse trabalho de levantar a turma de Itagiba é mais complicado do que investigar. Por isso o mínimo que posso cobrar pelo novo serviço é R$ 160 mil por mês — propôs em seguida.
E o Serra, vocês não vão querer investiga lo? — emendou.
Não é esse o trabalho. Além do mais, eu investigo o Serra e as privatizações há 10 anos e devo ter, no mínimo, dois tiros fatais contra ele — repliquei.
Artificiosamente, ao depor na comissão do Congresso, Sousa dirá que eu teria afirmado isso no primeiro encontro. Um subterfúgio, já que o comentário ocorreu no segundo cuja existência ele
não admite...
Pressenti que a oferta, envolvendo Serra, era uma emboscada.
Despedi me de Dadá e de Sousa, dizendo que iria levar a contraproposta a Lanzetta, o que nunca fiz.
Intuitivamente, achei que era hora de interromper qualquer contato com o ex delegado. Senti que ele estava jogando no time adversário, o que o tempo não demoraria a evidenciar...
Apreensivo com o comportamento de Sousa, tentei localizar o dono da Lanza. Não o encontrei na QI 05. Pessoas próximas a Lanzetta, que sabiam por que eu havia sido acionado, me imploravam para descobrir quem era o traidor ou traidores. Fui informado de acontecimentos que só aumentavam minha inquietação. Soube, por exemplo, que Palocci e Falcão haviam trazido dois “voluntários” de São Paulo que estavam trabalhando de graça na Pepper, agência levada para a campanha por indicação do marqueteiro João Santana, homem de confiança de Palocci. Mais: a dupla e mais a própria dona da Pepper estariam investigando os meus passos desde o dia em que pus pela primeira vez os pés dentro da casa. Queriam, a todo custo, saber o que eu fazia ali. Por telefone, fui tirar satisfação com Lanzetta, mas ele saiu em defesa da Pepper, o que continua fazendo até hoje.
Percebi que era hora de romper, por segurança, o vínculo até mesmo com Lanzetta, e abortar qualquer hipótese de assinatura de contrato. Passei no hotel para retirar minha passagem, e no trajeto para o aeroporto, comecei a ver fantasmas em todos os lados. No caminho para o setor de check in, dei meia volta, desci a escada e retirei a bateria do celular. Naquele momento cheguei a imaginar que meus passos estavam sendo monitorados por satélite. Peguei outro táxi em direção à rodoviária e de lá para minha fazenda no interior de Minas. Em pânico, deixei Brasília, onde, nas proximidades, já havia sido baleado. Senti que algo de ruim estava prestes a acontecer. Era só esperar.

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